Nas últimas semanas, o governo de SC disse repetidas vezes que não tinha dinheiro para bancar o aumento salarial pedido pelos professores em greve. Novos cálculos foram feitos por técnicos da Educação e apresentados à Fazenda, e outra proposta salarial surgiu na quinta-feira. Mas, como foi possível, para o governo, aumentar os gastos máximos mensais de R$ 14 milhões para os atuais R$ 19 milhões?
A verdade é que há dinheiro em caixa. A margem de gasto com a folha de pagamento do governo poderia aumentar em até R$ 548 milhões – e sem chegar ao limite máximo. A margem de manobra permitiu que o governo melhorasse a proposta, mas também acendeu a luz de alerta. O governador Raimundo Colombo se apressou em sugerir a criação de grupos de trabalho para avaliar demandas de outras categorias. O cenário foi confirmado, pela primeira vez desde o início da greve, pelo secretário-adjunto da Educação, Eduardo Deschamps. Nestas páginas, saiba mais sobre as contas do Estado, a aplicação dos recursos para a educação e os problemas que precisam ser resolvidos.
Folga na folha
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) limita os gastos do governo federal, estados e municípios com a folha de pagamento. O Executivo, responsável pelos salários do magistério, pode comprometer até 49% da receita líquida com a folha.
Para chegar ao limite máximo, o governo de SC teria que gastar pouco mais de R$ 853 milhões este ano. Mas nenhum governo gosta de chegar tão longe. O limite prudencial, de 46,55%, já prevê restrições para quem chegou a este ponto, como a impossibilidade da criação de cargos ou funções que possa significar aumento de despesas.
Nas últimas duas semanas, técnicos da Educação fizeram simulações para tentar melhorar os reajustes previstos na tabela da medida provisória (MP) encaminhada à Assembleia Legislativa (AL). Só foi possível apresentar um novo quadro com valores de salário-base porque existe uma folga no orçamento antes de atingir os limites da LRF.
Limite ampliado
O desafio das simulações, segundo Deschamps, era aplicar o piso de R$ 1.187 para os professores que ganham menos – R$ 609,46. Os técnicos também deveriam conseguir dar ganho real às 84 variações de vencimento da categoria, sem diminuir a remuneração e respeitando o limite imposto pela Fazenda. A possibilidade inicial era de ampliar em R$ 14 milhões os gastos mensais com o magistério.
– Já avançamos e estamos chegando a um patamar de R$ 17 milhões ou R$ 19 milhões por mês, em uma folha que era de R$ 146 milhões (mensais) – revelou Deschamps.
A necessidade de ampliar o limite surgiu com a resistência do magistério à tabela da MP, que igualava o salário de 31 mil professores em R$ 1.187. Os outros 28,9 mil, na ativa ou aposentados, não receberiam reajuste.
Com o sinal verde da Fazenda para ampliar o limite de gastos, o governo propôs uma nova tabela, pela qual os professores que recebem R$ 609,46 passariam para R$ 1.190.
Algumas perdas
A tabela salarial dos professores, conquista de uma greve feita há 25 anos, prevê 12 níveis e sete outras classificações para cada um deles. Cada graduação contempla um nível diferente de formação, cursos de aperfeiçoamento e tempo de carreira.
A nova proposta do Estado ignora o índice de 2,75% de aumento no salário-base vigente entre 21 graduações de um mesmo nível de formação. Iguala, por exemplo, o ganho inicial de 1.678 professores ativos e aposentados que hoje recebem entre R$ 609,46 e R$ 717,19.
Faz parte da proposta a redução dos valores pagos para a regência de classe e a extinção de bonificações, como os prêmios Educar, Jubilar e por assiduidade. Apenas o Educar pode significar uma diminuição de R$ 200 para cada professor. Por isso, quem ganha menos também passaria a ter uma remuneração menor com a nova proposta do que com a MP.
– Precisávamos fazer uma redistribuição, e quando se avança nos níveis mais altos, é preciso buscar os recursos para contemplar isso. A nova proposta distribui recursos para todo mundo, não apenas para um grupo.
Outros servidores
A fatia da Educação tem limite, segundo Deschamps, porque a Fazenda está analisando os recursos disponíveis, as perspectivas de arrecadação para este ano e o impacto que reajustes de outras categorias de servidores pode ter para as contas.
– O governo tem um olhar mais global, em relação a todas as categorias. Por isso o governador propôs a criação de grupos de trabalho, como foi feito com a Educação, para avançar mais em relação aos valores para a segurança pública, a saúde e as demais categorias.
Nunca os 25%
Entre janeiro e abril deste ano, SC não apenas gastou menos que os 25% obrigatórios com Educação – índice que deve ser alcançado até o fim do ano –, como também gastou parte dos recursos pagando aposentados.
Segundo dados da Fazenda, dos R$ 775,9 milhões gastos com a Educação no período, R$ 130 milhões foram usados para o pagamento de servidores inativos.
– Ao fazer isso, o governo está descumprindo um mandamento constitucional – pondera o diretor de controle da administração estadual do TCE, Nevelis Scheffer Simão.
Desvio de finalidade
Em 2002, o Ministério Público de SC entrou com uma ação civil pública contra o Estado para proibir que recursos do Fundef (substituído pelo Fundeb em 2007) fossem utilizados para pagar aposentados e que as verbas do fundo ficassem em uma conta específica, impedindo que os recursos fossem para outros fins que não a educação.
O governo perdeu na primeira instância, em 2004, e recorreu. Dois anos depois, saiu a decisão final, confirmando a de 2004.
Sem a conta específica, segundo Deschamps, os recursos do Fundeb entram na base de cálculo da receita líquida. Ou seja, a verba que deveria ser específica da Educação entra na vala comum de onde saem os recursos que pagam as contas de toda a administração – incluindo o Legislativo e Judiciário.
Informado de que o governo continua adicionando parte do pagamento de aposentados na conta da Educação, o Ministério Público disse que irá averiguar a situação e, após esta análise, indicará as medidas necessárias.
Outros nós para resolver
No relatório sobre as contas 2010, o conselheiro do TCE Salomão Ribas Júnior questionou a não aplicação dos recursos do salário-educação no ano passado. Do total arrecadado, R$ 119,17 milhões, R$ 11,45 milhões não foram gastos. Sem contar o saldo não aplicado de R$ 15,48 milhões de anos anteriores.
– Diante da situação em que se encontra o sistema educacional no Estado, que sofre com a retirada de recursos financeiros pelo sistema Seitec e Fundosocial, o acúmulo destes superávits se torna incompreensível – escreveu.
Ribas questiona os mecanismos de controle do Sistema Estadual de Incentivo ao Turismo, Esporte e Cultura (Seitec) e a vinculação de receitas de impostos ao Fundosocial, que tirariam verbas da Educação – R$ 455,21 milhões nos últimos cinco anos, segundo o TCE.
Para Deschamps, SC só vai resolver os nós do ensino se reestruturar a secretaria da Educação, otimizando recursos, agilizando processos e descentralizando parte dos recursos para serem aplicados mais rapidamente nas escolas.
alessandra.ogeda@diario.com.br
ALESSANDRA OGEDA
A verdade é que há dinheiro em caixa. A margem de gasto com a folha de pagamento do governo poderia aumentar em até R$ 548 milhões – e sem chegar ao limite máximo. A margem de manobra permitiu que o governo melhorasse a proposta, mas também acendeu a luz de alerta. O governador Raimundo Colombo se apressou em sugerir a criação de grupos de trabalho para avaliar demandas de outras categorias. O cenário foi confirmado, pela primeira vez desde o início da greve, pelo secretário-adjunto da Educação, Eduardo Deschamps. Nestas páginas, saiba mais sobre as contas do Estado, a aplicação dos recursos para a educação e os problemas que precisam ser resolvidos.
Folga na folha
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) limita os gastos do governo federal, estados e municípios com a folha de pagamento. O Executivo, responsável pelos salários do magistério, pode comprometer até 49% da receita líquida com a folha.
Para chegar ao limite máximo, o governo de SC teria que gastar pouco mais de R$ 853 milhões este ano. Mas nenhum governo gosta de chegar tão longe. O limite prudencial, de 46,55%, já prevê restrições para quem chegou a este ponto, como a impossibilidade da criação de cargos ou funções que possa significar aumento de despesas.
Nas últimas duas semanas, técnicos da Educação fizeram simulações para tentar melhorar os reajustes previstos na tabela da medida provisória (MP) encaminhada à Assembleia Legislativa (AL). Só foi possível apresentar um novo quadro com valores de salário-base porque existe uma folga no orçamento antes de atingir os limites da LRF.
Limite ampliado
O desafio das simulações, segundo Deschamps, era aplicar o piso de R$ 1.187 para os professores que ganham menos – R$ 609,46. Os técnicos também deveriam conseguir dar ganho real às 84 variações de vencimento da categoria, sem diminuir a remuneração e respeitando o limite imposto pela Fazenda. A possibilidade inicial era de ampliar em R$ 14 milhões os gastos mensais com o magistério.
– Já avançamos e estamos chegando a um patamar de R$ 17 milhões ou R$ 19 milhões por mês, em uma folha que era de R$ 146 milhões (mensais) – revelou Deschamps.
A necessidade de ampliar o limite surgiu com a resistência do magistério à tabela da MP, que igualava o salário de 31 mil professores em R$ 1.187. Os outros 28,9 mil, na ativa ou aposentados, não receberiam reajuste.
Com o sinal verde da Fazenda para ampliar o limite de gastos, o governo propôs uma nova tabela, pela qual os professores que recebem R$ 609,46 passariam para R$ 1.190.
Algumas perdas
A tabela salarial dos professores, conquista de uma greve feita há 25 anos, prevê 12 níveis e sete outras classificações para cada um deles. Cada graduação contempla um nível diferente de formação, cursos de aperfeiçoamento e tempo de carreira.
A nova proposta do Estado ignora o índice de 2,75% de aumento no salário-base vigente entre 21 graduações de um mesmo nível de formação. Iguala, por exemplo, o ganho inicial de 1.678 professores ativos e aposentados que hoje recebem entre R$ 609,46 e R$ 717,19.
Faz parte da proposta a redução dos valores pagos para a regência de classe e a extinção de bonificações, como os prêmios Educar, Jubilar e por assiduidade. Apenas o Educar pode significar uma diminuição de R$ 200 para cada professor. Por isso, quem ganha menos também passaria a ter uma remuneração menor com a nova proposta do que com a MP.
– Precisávamos fazer uma redistribuição, e quando se avança nos níveis mais altos, é preciso buscar os recursos para contemplar isso. A nova proposta distribui recursos para todo mundo, não apenas para um grupo.
Outros servidores
A fatia da Educação tem limite, segundo Deschamps, porque a Fazenda está analisando os recursos disponíveis, as perspectivas de arrecadação para este ano e o impacto que reajustes de outras categorias de servidores pode ter para as contas.
– O governo tem um olhar mais global, em relação a todas as categorias. Por isso o governador propôs a criação de grupos de trabalho, como foi feito com a Educação, para avançar mais em relação aos valores para a segurança pública, a saúde e as demais categorias.
Nunca os 25%
Entre janeiro e abril deste ano, SC não apenas gastou menos que os 25% obrigatórios com Educação – índice que deve ser alcançado até o fim do ano –, como também gastou parte dos recursos pagando aposentados.
Segundo dados da Fazenda, dos R$ 775,9 milhões gastos com a Educação no período, R$ 130 milhões foram usados para o pagamento de servidores inativos.
– Ao fazer isso, o governo está descumprindo um mandamento constitucional – pondera o diretor de controle da administração estadual do TCE, Nevelis Scheffer Simão.
Desvio de finalidade
Em 2002, o Ministério Público de SC entrou com uma ação civil pública contra o Estado para proibir que recursos do Fundef (substituído pelo Fundeb em 2007) fossem utilizados para pagar aposentados e que as verbas do fundo ficassem em uma conta específica, impedindo que os recursos fossem para outros fins que não a educação.
O governo perdeu na primeira instância, em 2004, e recorreu. Dois anos depois, saiu a decisão final, confirmando a de 2004.
Sem a conta específica, segundo Deschamps, os recursos do Fundeb entram na base de cálculo da receita líquida. Ou seja, a verba que deveria ser específica da Educação entra na vala comum de onde saem os recursos que pagam as contas de toda a administração – incluindo o Legislativo e Judiciário.
Informado de que o governo continua adicionando parte do pagamento de aposentados na conta da Educação, o Ministério Público disse que irá averiguar a situação e, após esta análise, indicará as medidas necessárias.
Outros nós para resolver
No relatório sobre as contas 2010, o conselheiro do TCE Salomão Ribas Júnior questionou a não aplicação dos recursos do salário-educação no ano passado. Do total arrecadado, R$ 119,17 milhões, R$ 11,45 milhões não foram gastos. Sem contar o saldo não aplicado de R$ 15,48 milhões de anos anteriores.
– Diante da situação em que se encontra o sistema educacional no Estado, que sofre com a retirada de recursos financeiros pelo sistema Seitec e Fundosocial, o acúmulo destes superávits se torna incompreensível – escreveu.
Ribas questiona os mecanismos de controle do Sistema Estadual de Incentivo ao Turismo, Esporte e Cultura (Seitec) e a vinculação de receitas de impostos ao Fundosocial, que tirariam verbas da Educação – R$ 455,21 milhões nos últimos cinco anos, segundo o TCE.
Para Deschamps, SC só vai resolver os nós do ensino se reestruturar a secretaria da Educação, otimizando recursos, agilizando processos e descentralizando parte dos recursos para serem aplicados mais rapidamente nas escolas.
alessandra.ogeda@diario.com.br
ALESSANDRA OGEDA
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